Entrar na Arquivo em Leiria não é só entrar numa livraria. Para mim é conseguir recuar ao ano de 1997 e às boas memórias que guardo daquelas grandes livrarias nos Estados Unidos que conheci durante o ano que lá vivi (sim, o Hard Rock Café também tem essa capacidade de viagem no tempo, como já aqui vos contei).
Nessa altura, estar numa livraria com cafetaria foi mesmo uma das coisas que mais me surpreendeu, assim como os bancos terem um drive-in ao estilo do McDonald’s (mas sobre isso vou contar-vos outro dia).
A verdade é que quando deixei Portugal em Janeiro de 1997, não conhecia nenhuma livraria onde se pudesse beber um café ou comer qualquer coisa. Nem um lugar onde se pudesse estar, confortavelmente sentado, sem pressas ou olhares que incomodam, a descobrir as páginas dos livros expostos.
Então agora imaginem, a gostar de livros e café / chá como gosto, qual o meu delírio quando encontrei do outro lado do Atlântico esta simpática novidade. Não voltei mais aos Estados Unidos depois deste ano de intercâmbio, mas acredito que hoje em dia as diferenças não serão tão grandes, o que lá existe ou se faz também cá chega rapidamente, mas neste fim dos anos 90 não era nada assim. Nos States vivia-se um estilo de vida bastante diferente do nosso e isto foi uma das coisas que mais me impressionou.
Era então nestas livrarias – conheci uma que até lareira e pianista ao vivo tinha – que passava bastante do meu tempo livre, a ler, a estudar, a bebericar café ou chá daquelas enormes chávenas enquanto escrevia as longas cartas para casa (manuscritas e enviadas por correio). Sim, se bem se lembram, já vivemos uma época em que o mundo existia sem internet, em que o skype e o whatsapp eram ainda completa ficção científica!
A Arquivo foi então a primeira livraria com cafetaria que conheci em Portugal depois do meu regresso e é sempre à procura de mimos para a alma e de novidades para o intelecto que lá volto (e encontro!). Principalmente nestes dias de Inverno, chuvosos e cinzentos, em que só apetece voltar a imaginar um tempo só nosso e a sentir aquele aconchego tão especial que só os lugares familiares têm.
Digo-vos, sinto mesmo uma nostalgia muito boa sempre que lá entro e isso deve até notar-se no sorriso descarado na cara com que passo aquela porta (mas se porventura alguém um dia reparar, pelo menos agora já sabem do que se trata). E como este é mais um lugar bem especial, só podia estar também na lista do meu projecto 40 anos, 40 lugares.
Pois se recomendo sempre uma visita à Arquivo, em dias em que a chuva e o frio não dão tréguas este é sem dúvida um lugar que funciona bem como Plano B – o tal, de que tanto falo quando o assunto é viajar em família.
Porque a minha relação com a Arquivo não acaba na história da cafetaria. Foi também aqui que encontrei pela primeira vez uma agenda cultural bastante completa e gratuita inserida numa livraria. Foi aqui que os meus miúdos assistiram várias vezes à hora do conto aos sábados à tarde. Foi aqui que assisti a lançamentos de livros e workshops.
É aqui que continuo a encontrar um atendimento muito caloroso e foi também aqui que marquei encontro com a Ana que veio acompanhada pelo Guilherme de 4 anos (o irmão de 8 meses ficou em casa com o pai). E a conversa que estava à partida limitada por uma hora por conta de outros compromissos acabou por se estender por uma tarde inteira.
E aproveito desde já a oportunidade para pedir desculpas aos lesados. Mas, bem vistas as coisas, os atrasos na nossa agenda social têm culpados identificados. 🙂
A culpa é toda, mas toda:
dos bolinhos secos …
do chá e da tarde de maçã do chef Bruno …
do sossego do primeiro andar e do acesso à internet…
do espaço infantil da livraria…
da exposição de desenhos …
da hora do conto …
e consequente modelagem de balões!!
Enfim, já deu para ver que a Arquivo é muito mais do que uma livraria, certo? Porque há lugares assim, que não são apenas lugares físicos. Ocupam espaço no nosso coração. Contam histórias, transmitem sentimentos, exaltam memórias. E com este meu projecto dos 40 anos, 40 lugares são precisamente estes sítios que vos quero mostrar.
Convidei a Ana para esta tarde de conversa porque sabia que a Arquivo fazia parte da vida dela. O que não sabia é que ela e as amigas aproveitavam os intervalos da escola para fazer uma visita relâmpago à livraria e espreitar as novidades editoriais, assim como quem vai à procura de um tesouro proibido.
Não sabia que há sempre actividades culturais a decorrer, como é o caso do festival anual de música só com bandas do distrito de Leiria que acontece durante o mês de Setembro, no qual a Arquivo participa com concertos para bebés, Ana e família são presença assídua claro!
Também não sabia que ela sempre lá comprou os livros de apoio escolar e que agora é pouso constante dos filhos, especialmente do mais velho que gosta de ver e rever, explorar e pedir para levar com ele todos os livros de que gosta.
“Livros raramente recuso comprar”, disse-me em jeito de desabafo. E eu só pensei, como te compreendo!… Aliás, a própria Ana é também uma contadora de histórias – partilha digitalmente a aventura da maternidade no seu blog My Little Man – e fiquei mesmo feliz por saber que já ganhou coragem para planear viagens com os filhos.
Sim, que dizem que nisto de viajar em família também é preciso um bocadinho de coragem. Ou de ver para crer. Eu diria até que é preciso é tomar-lhe o gosto, depois de ver que afinal é mais fácil do que parece, não vão querer mais viajar sem os pequenos!
Pois foi precisamente isso que aconteceu quando viajou com o marido (e o Eduardo na barriga) para Istambul. Lembra-se de ver no aeroporto uma família com 3 ou 4 filhos e espantou-lhe a descontração familiar, a fluidez com que a coisa corria. Por isso, agora decidiram planear as primeiras férias em família no estrangeiro.
O Guilherme até já sabe muito bem onde quer ir – quer ver neve e andar de avião. Eu ainda lhe disse que pode ir à neve de carro ou de comboio, mas nem pensem que sonhos de criança são assim fáceis de demover…Está decidido, é de avião que vão e não se fala mais nisso!
Alguém conhece a Arquivo em Leiria?
Ou alguém tem histórias de livrarias pelo mundo para partilhar?
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Arquivo – Bens Culturais, Lda
Av. Combatentes da Grande Guerra, 53 – Leiria
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Este é o lugar #4 do Projecto 40 anos, 40 lugares
Acompanhem este projecto! Espreitem só o que já visitei desde Janeiro:
#0 – O Baleal é a minha praia – Peniche
#1 – A Gulbenkian em Lisboa está cheia de curiosidades – Lisboa
#2 – O charme e as histórias do Parque das Caldas da Rainha – Caldas da Rainha
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2 Comentários
Gosto imenso de ir às actividades da livraria Arquivo quando tem autores do meu interesse, e também gosto de lá ir tomar um abatanado enquanto espero alguém com quem me encontrar (a Arquivo tende a ser o ponto de encontro). Excelente texto 🙂
Muito obrigada Roberta por passar por aqui e pela partilha pessoal. A Arquivo também é o meu ponto de encontro em Leiria 🙂